terça-feira, 8 de maio de 2007

VÊNUS E MARTE de Botticelli

E eu que por muito tempo cri que o motor decisivo da vida fosse formado por glândulas. Eu que engolia tudo: do caroço às cascas da laranja. Que era arrastado por uma fome canina. Pelo sangue grosso da jugular.
Foi em tempo que me distraí, dei um passo em falso e me perdi neste pomar. Foi quando vi: Vênus, a deusa do amor, deitada com Marte, o deus da guerra, sobre a grama.

Ela sequer trazia marcas de violência sobre seus vestidos.
Ele arqueava o peito sob a força de enorme gozo.

Mas de onde vinha esse lampejo de fogo, visto que não havia entre eles um único sinal de amor carnal, de coito? Vinha do fato dele ter apenas se deparado com sua presença, de ter confirmado que o amor existia – o que já era suficiente para que qualquer um viesse a depor suas armas e tirar a própria armadura. Quando você me agasalhou com sua ternura, fiquei meio assim: ninho em alarido, e com vacilação mui particular permiti que você se aproximasse do meu pomar, onde nem mais sabia que se cultivavam jambos e rosas.

Hoje, um vento estranho balançou meus cabelos.

E assim soube que você nunca mais foi embora.

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